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ITBI e IPTU: o STJ e os impostos municipais que incidem sobre imóveis (parte 2)

ITBI e IPTU: o STJ e os impostos municipais que incidem sobre imóveis (parte 2)

Previstos no artigo 156 da Constituição Federal e nos artigos 32 a 42 do Código Tributário Nacional (CTN), o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) compõem parte importante da receita dos municípios brasileiros – entes federativos competentes para instituir e regulamentar esses tributos.

Fonte: STJ. Acessado em 07/11/2022.

Previstos no artigo 156 da Constituição Federal e nos artigos 32 a 42 do Código Tributário Nacional (CTN), o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) compõem parte importante da receita dos municípios brasileiros – entes federativos competentes para instituir e regulamentar esses tributos.

Como impostos não possuem finalidade específica, os recursos arrecadados se destinam a financiar serviços públicos em geral, fornecidos pelos municípios, como construção de escolas e creches, pavimentação, saneamento básico e ampliação do atendimento de saúde.

Aumentar a arrecadação é um esforço constante dos municípios. Por outro lado, para quem é proprietário, suportar os encargos tributários decorrentes da aquisição e da manutenção do imóvel pode ser pesado, o que acaba levando muitos casos à apreciação do Poder Judiciário.

Os imóveis sujeitos à cobrança, quem deve pagar, os critérios para aumento do tributo e os prazos de prescrição são alguns dos muitos assuntos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem analisando nos últimos anos em relação ao IPTU, tema desta segunda reportagem sobre a jurisprudência da corte e os impostos municipais relacionados a imóveis.

Quanto ao IPTU, o ministro Gurgel de Faria, em julgamento recente (REsp 1.937.821), explicou que ele tributa a propriedade, “lançando-se de ofício o imposto tendo por base de cálculo a Planta Genérica de Valores aprovada pelo Poder Legislativo local, que considera aspectos mais amplos e objetivos como, por exemplo, a localização e a metragem do imóvel”.

Atualização e notificação de lançamento

Na Súmula 160, a Primeira Seção do tribunal fixou a tese de que é proibido ao município atualizar o IPTU por decreto em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma julgou, em 2019, o AgInt no AREsp 1.351.651, de relatoria da ministra Assusete Magalhães. O recurso discutia se seriam nulos os créditos de IPTU atualizados mediante decreto.

Em seu voto, a relatora destacou que, nos termos da Súmula 160, o que se impede é “a majoração da base de cálculo do IPTU por meio de decreto, e não a mera atualização monetária”.

No julgamento, a turma aplicou também a Súmula 397. “A jurisprudência desta corte é firme no sentido de que a notificação do lançamento do IPTU e das taxas municipais ocorre com o envio da correspondente guia de recolhimento do tributo para o endereço do imóvel ou do contribuinte, com as informações que lhe permitam, caso não concorde com a cobrança, impugná-la administrativa ou judicialmente”, afirmou a relatora.

IPTU em área urbanizável e de expansão urbana

No AgInt no REsp 1.930.613, sob a relatoria do ministro Francisco Falcão, a Segunda Turma reforçou que a incidência do IPTU sobre imóvel situado em área considerada pela lei local como urbanizável ou de expansão urbana não está condicionada à existência dos melhoramentos elencados no artigo 32, parágrafo 1º, do CTN, conforme enunciado da Súmula 626.

O recurso teve origem em ação anulatória de débito fiscal ajuizada por dois contribuintes, referente à cobrança retroativa de IPTU sobre imóvel antes situado em área rural, porém tornada urbana em virtude de alteração no plano diretor do município.

Na sentença, o pedido foi julgado procedente – decisão mantida em segunda instância, sob o fundamento de não haver pelo menos dois dos requisitos indicados pelo CTN para a classificação da área como urbana.

Ao votar pela reforma do acórdão do tribunal de origem, o ministro Falcão citou como precedentes o REsp 1.903.076 e o AREsp 1.517.241.

A responsabilidade pelo IPTU na alienação fiduciária

Ao julgar o AREsp 1.796.224, a Primeira Turma entendeu que o credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade em seu nome e da imissão na posse do imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do IPTU, uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no artigo 34 do CTN.

A relatoria foi do ministro Gurgel de Faria. Segundo ele, no REsp 1.111.202, submetido ao rito dos repetitivos (Tema 122), o STJ definiu que cabe ao legislador municipal eleger o sujeito passivo do IPTU, entre as opções previstas no CTN – tese que deu origem à Súmula 399.

“Em relação aos créditos de IPTU, o entendimento desta corte superior se consolidou no sentido de que se consideram contribuintes do referido imposto o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título”, afirmou o relator.

Entretanto, no caso do credor fiduciário, o ministro anotou que a propriedade a ele conferida é resolúvel e nunca será plena, não sendo ele detentor do domínio útil sobre o imóvel, de forma que passaria a responder pelas dívidas tributárias e não tributárias incidentes sobre o bem somente a partir da consolidação da propriedade em conjunto com a imissão na posse, em hipótese de sucessão (artigo 27, parágrafo 8°, da Lei 9.514/1997).

“A propriedade conferida ao credor fiduciário é despida dos poderes de domínio e de propriedade (uso, gozo e disposição), sendo a posse indireta por ele exercida desprovida de ânimo de domínio, considerando-se a inexistência do elemento volitivo: a vontade de ter o bem como se seu fosse”, declarou Gurgel de Faria.

Proprietário e usufrutuário são contribuintes do IPTU

No REsp 1.111.202 (Tema 122), ficou estabelecido pela Primeira Seção que “tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no registro de imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU”.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, em 2022, decidiu que, no caso de imóvel gravado com usufruto, tanto o proprietário, que remanesce com o domínio indireto, quanto o usufrutuário, que exerce a posse direta e detém o domínio útil, são contribuintes do IPTU, podendo a lei municipal disciplinar a sujeição passiva de qualquer um deles ou, ainda, de ambos (AREsp 1.566.893). A relatoria foi do ministro Gurgel de Faria.

Na origem, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) havia entendido pela ilegitimidade do nu-proprietário para constar no polo passivo da execução fiscal de IPTU, ao fundamento de que ele não seria contribuinte desse tributo sobre o imóvel objeto de usufruto, apenas recaindo a condição de contribuinte sobre o usufrutuário.

O relator destacou que a conclusão a que chegou o TJSP já teve o respaldo na jurisprudência do STJ no passado. Entretanto, ressaltou que, após o julgamento do Tema 122, a posição do tribunal foi atualizada, passando a se orientar em sentido diverso.

“A Primeira Seção, no julgamento dos REsps 1.111.202 e 1.110.551, submetidos à sistemática dos recursos repetitivos, ao decidir sobre a responsabilidade dos promitentes vendedor e comprador de imóvel, assentou que o artigo 34 do CTN elenca como contribuintes do IPTU tanto o proprietário quanto o possuidor da coisa, desde que tenha animus domini”, disse o ministro.

Imunidade tributária e de jurisdição

No RO 138, de relatoria do ministro Herman Benjamin, a Segunda Turma reafirmou a jurisprudência segundo a qual os Estados estrangeiros possuem imunidade tributária e de jurisdição, conforme os preceitos das Convenções de Viena de 1961 e de 1963, sendo descabida a execução fiscal para cobrança de IPTU.

Na origem, o município do Rio de Janeiro ajuizou execução fiscal contra a República da Argentina para a cobrança de IPTU e de Taxa de Coleta Domiciliar de Lixo – processo que foi extinto pelo juiz sem resolução do mérito, em razão da imunidade de jurisdição. O município alegou que, no Brasil, prevalece a teoria da imunidade relativa, segundo a qual o Estado estrangeiro deve ser submetido à jurisdição de outro quando atua como simples particular.

Em seu voto, o ministro Herman Benjamin citou precedentes tanto da Primeira quanto da Segunda Turma no sentido de que os Estados estrangeiros são dispensados do pagamento de tributos que recaiam sobre seu patrimônio ou lhes sejam exigidos pela prestação não individualizada de serviços. “Não se pode admitir o prosseguimento do processo em relação à cobrança de IPTU”, definiu Benjamin.

Locatário não pode discutir relação jurídico-tributária do IPTU

Ainda sobre o tema, a Primeira Turma, ao julgar o AREsp 1.065.190, entendeu que o IPTU deve incidir sobre imóvel alugado para representante de consulado.

No recurso, interposto por representante de consulado da Turquia, pleiteou-se isenção de IPTU baseada na Convenção de Viena, além da devolução do imposto que foi recolhido durante a vigência do contrato.

O relator, ministro Gurgel de Faria, ressaltou que a isenção tributária prevista na Convenção de Viena sobre Relações Consulares só pode ser concedida aos imóveis dos quais o Estado estrangeiro signatário seja proprietário.

De acordo com o magistrado, a Convenção de Viena sobre Relações Consulares não se aplica aos tributos incidentes sobre imóvel alugado a Estado estrangeiro para o exercício de sua missão consular, “visto que o ordenamento jurídico brasileiro não atribui essa responsabilidade tributária ao locatário, mas ao proprietário (locador)”.

Quanto à devolução do imposto já pago, o relator reforçou a previsão da Súmula 614 no sentido de que o locatário não tem legitimidade ativa para discutir a relação jurídico-tributária de IPTU e de taxas referentes ao imóvel alugado, nem para pedir a restituição de tributo pago a mais nesses casos.

Definições sobre o prazo de prescrição

No julgamento dos Recursos Especiais 1.658.517 e 1.641.011 (Tema 980), ambos de relatoria do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, a Primeira Seção fixou duas importantes teses sob o rito dos repetitivos.

A primeira define que o prazo prescricional da cobrança judicial do IPTU começa no dia seguinte à data estipulada para o vencimento do imposto. Em seu voto, o relator destacou que, até o vencimento, o fisco “não dispõe de pretensão executória legítima para ajuizar execução fiscal objetivando a cobrança judicial, embora já constituído o crédito desde o momento no qual houve o envio do carnê para o endereço do contribuinte (Súmula 397)”.

Já a segunda estabelece que o parcelamento de ofício da dívida tributária não configura causa interruptiva da contagem da prescrição, uma vez que o contribuinte não anuiu. Sobre esse ponto, o ministro afirmou que, se o fisco resolve oferecer a opção de parcelamento para pagamento do IPTU por decisão unilateral, por mera liberalidade, não se pode chegar à conclusão de que houve moratória ou parcelamento do crédito tributário capaz de suspender o prazo prescricional para a cobrança do crédito.

“Necessária manifestação de vontade do contribuinte a fim de configurar moratória ou parcelamento apto a suspender a exigibilidade do crédito tributário”, concluiu o ministro.

Imóvel qualificado como estação ecológica

Em 2019, a Segunda Turma do STJ entendeu que a qualificação de imóvel como estação ecológica limita o direito de propriedade, o que afasta a incidência do IPTU (REsp 1.695.340).

Na ocasião, o colegiado analisou o recurso de um contribuinte contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que manteve a cobrança de IPTU exigida pelo município de Belo Horizonte sobre seu imóvel, o qual, a partir da edição de lei estadual, passou a ficar situado em unidade de conservação.

O tribunal local ressaltou que a criação da estação ecológica não transfere, automaticamente, a titularidade do imóvel do contribuinte para o ente público, permanecendo o particular responsável pelo pagamento do tributo até a efetiva desapropriação.

Embora a Lei 9.985/2000, que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, tenha definido que a estação ecológica é zona rural, o TJMG fundamentou que ela não tem o efeito de alterar a natureza jurídica do imóvel e mudar o fato gerador do tributo, em razão de não ser lei complementar.

Em seu voto, o relator do recurso no STJ, ministro Mauro Campbell Marques, destacou que a limitação trazida por lei estadual e a consequente aplicação dos dispositivos da Lei 9.985/2000 acarretaram ao particular o esvaziamento completo dos atributos inerentes à propriedade (reivindicação, uso e gozo do bem), retirando-lhe o domínio útil do imóvel e afastando o aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU.

“O regime de unidade de conservação é incompatível com a caracterização do fato gerador do Imposto Predial e Territorial Urbano, pois, de acordo com o artigo 49 da Lei 9.985/2000, a área destinada a essa finalidade é considerada imóvel rural, o qual somente pode ser tributado pelo Imposto Territorial Rural, cuja competência tributária é específica da União, e não do município de Belo Horizonte”, concluiu o ministro.

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